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quinta-feira, 2 de setembro de 2010

O melancólico fim de José Serra

Reproduzo artigo de Idelber Avelar, publicado no blog Biscoito Fino e a Massa:

Pois é, valente Deputado Brizola Neto, o lacerdismo vive. Para os mais jovens, aí vai a frase de Carlos Lacerda que emblematiza o golpismo tupiniquim: "O senhor Getúlio Vargas não deve ser candidato à presidência; candidato, não deve ser eleito; eleito, não deve tomar posse; empossado, devemos recorrer à revolução para impedi-lo de governar".

Não há momento da história do Brasil em que, ameaçada pelas urnas, a direita não tenha recorrido a alguma variação do espírito dessa frase. Em vez de utilizar a campanha eleitoral para discutir o que interessa – saúde, educação, reforma agrária, política externa, política tributária, papel do Estado na economia–, nos vemos mais uma vez numa grotesca paródia de telenovela mexicana, rastreando um carimbo de cartório de setembro de 2009, indo atrás de contadores e advogados que assinaram ou deixaram de assinar um pedaço de papel, repetindo ad infinitum esse tedioso disse-me-disse dos factoides. A entrevista com o contador que levou à Receita Federal a solicitação de cópias das declarações de Imposto de Renda de Verônica Serra é um festival de chacotas. Quem diria, a sério, algo assim sobre qualquer candidato?: "Tenho nojo de política. Mas eu voto no Serra viu? Sou eleitor dele desde que ele nasceu".

Mais uma vez, o futebol nos oferece a metáfora perfeita: a quem interessa a confusão e a bagunça extra-campo? Qual é o time que quer tumulto? Qual é a equipe que deseja levar o jogo para o tapetão? Certamente não são aqueles que estão jogando na bola e ganhando a partida. Serra parece disposto a lançar ao lixo o que lhe resta de biografia honrada. Tudo indica que sairá deste processo passando vergonha: apelando para a pancada, reclamando com o juiz, escondendo a bola, como é de seu feitio.

Aqui, cabe uma palavra acerca do papel da mídia. Nada disso teria tomado a campanha eleitoral de assalto se não fosse pelo exército de manipuladores amestrados dos conglomerados máfio-midiáticos do país. Tento não subestimar nem superestimar o poder desses conglomerados. No ambiente volátil da internet, muitas vezes oscilamos entre os dois extremos, o da euforia (“depois da internet, morreu o poder da mídia!”) ou da conspiração maligna (“a mídia elegeu tal candidato, ela é responsável por esse ou aquele resultado eleitoral”). Acredito que a análise deve ser feita caso a caso. Creio, por exemplo, que no Sul a RBS tem um poder de distorção e manipulação que os Diários Associados não possuem em Minas Gerais. Também acho inegável que hoje já não há espaço para golpes como os perpetrados pela Globo em 1989.

Mas também acredito que não estaríamos discutindo isso se não fosse pela disposição da mídia brasileira de funcionar como porta-voz do golpismo. O Sr. Ricardo Noblat, depois de traficar mentiras sobre assassinatos, ontem entrou no ramo da manipulação de vídeo, editando e cortando uma entrevista de Dilma Rousseff, com grotesca distorção sonora ao fundo. Ele continua tendo a cara de pau de chamar isso de jornalismo.

Acabam de entrar, nada mais, nada menos, com uma representação no Tribunal Superior Eleitoral pedindo a impugnação da candidatura de Dilma Rousseff, por uma violação de sigilo fiscal da filha de Serra, ocorrida em setembro de 2009, sobre cujas relações com Dilma eles não possuem um fiapo, um miligrama, uma tutaméia de provas. Já tentaram isso antes. E o povo deu a resposta nas urnas, oferecendo ao pobre Alckmin menos votos no segundo turno que ele havia tido no primeiro, façanha inédita na história das eleições presidenciais brasileiras.

Pelo jeito, passaremos alguns dias nessa realidade paralela. Mas concordo com o leitor de Luis Nassif, que lembra que o relator dessa palhaçada será o Ministro Aldir Passarinho Jr., um legalista que honra a toga. O TSE é presidido pelo Ministro Ricardo Lewandowski, constitucionalista e brasileiro honrado, de quatro costados. É evidente que é preciso estar atento, mas tudo indica que o saldo do episódio será mais uma desmoralização para José Serra.

O que sua coalizão e a corja de jornalistas amestrados não parecem entender é que, num país com a história do nosso, essa é uma brincadeira muito perigosa.

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