Anúncio Superior

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

As estratégias do fascismo e a candidatura Serra

Rodrigo Guéron
Professor UERJ

Paul Virilio, filósofo e arquiteto francês, conta no seu livro “Guerra e Cinema” que as primeiras fotos que correram o mundo com alguns dos horrores dos campos de concentração nazistas foram distribuídas por ordem do próprio Goebbels, ministro da propaganda de Hitler. Em seguida, Goebbels divulgou uma nota à imprensa do mundo inteiro declarando-se “horrorizado com o tipo de propaganda que fazem contra nós estes comunistas e judeus”.

Enquanto John McCain, o candidato conservador à presidência dos Estados Unidos, recusou alguns ataques fundamentalistas a Obama em certos momentos da campanha eleitoral, no Brasil José Serra alimenta e navega satisfeito na onda de difamações, calúnias e terror psicológico contra a candidatura Dilma Roussef. Sua campanha, depois de trazer o fundamentalismo religioso para o debate eleitoral, de colocar sua mulher na rua dizendo que a Dilma “mata criancinhas”, usou uma manchete mentirosa do Globo que dizia que a Dilma ia assinar um documento contra a União Civil Gay (o que não aparecia no próprio corpo da notícia) para posar de “ liberal” e dizer que era a favor dessa união.

Ontem, a polícia federal entrou numa gráfica que imprimia mais de 2 milhões de panfletos que acusavam a Dilma de “aborteira”, falsamente assinados pela CNBB, mas feitos por ordem de um bispo ( com dinheiro de quem?). Enquanto isso Serra e Tasso Jereissati ( que acaba de ser derrotado na eleição para senador) iam a uma missa no Ceará onde panfletos semelhantes eram distribuídos ( neste caso diziam que a Dilma era “ aborteira”, que tinha ligações com as Farcs, era corrupta etc e tal). Um padre se indignou, disse aos fiéis que aqueles panfletos não tinham nada a ver com a igreja e com aquela celebração ( que era para São Francisco…). Jereissati então começou a ofender o padre, chamou o de “padre petista” e militantes do PSDB foram atrás do religioso que teve que sair da igreja protegido.

Quando Lula reclamou dos ataques que Dilma tem sofrido da imprensa, quando disse que esta age como partido político e que tem candidato, mas se apresenta como “imparcial”, foi acusado de ser “contra a liberdade de imprensa”. Por outro lado ninguém viu no jornal Nacional, nem no Globo, nem na Veja (uma pequena nota na FSP), que Serra mandou desligar a câmera numa entrevista para a jornalista Marcia Peltier, dizendo que aquele tipo de pergunta não respondia, que ia embora e era para fingir que ele não tinha estado ali. As imagens do Serra fazendo isso foram entregues ao próprio pela direção da CNT ( que vergonhoso gesto para um jornalista…), mas o áudio, gravado no celular de um outro jornalista que estava na platéia, está na rede.

Imaginem se fosse a Dilma que tivesse mandado desligar a câmera? Íamos ver as imagens repetidamente no Jornal Nacional e similares durante dias. Dilma é então acusada de ser uma “ameaça a liberdade de imprensa” por aqueles que censuram, manipulam e até inventam fatos contra a sua campanha. O fascismo sempre agiu assim, acusa os outros do que está fazendo. Goebels, como vimos, pousou de vítima dos judeus e comunistas que estava exterminando.

Dilma também foi acusada, no início da campanha, de “mandar preparar dossiês contra Serra e a sua família”: dossiês que ninguém leu. Enquanto isso os que fizeram essa acusação despejam um dossiê gigante e ininterrupto de calúnias contra ela. A tática de propaganda fascista é esta da confusão, da acusação, da repetição de uma mentira sistemática até virar verdade, da demonização e escolha de bodes espiatórios.

O fascismo é violento não apenas porque mente e cassa a palavra das pessoas ( como houve com Maria Rita Kehl, demitida do Estadão apenas por ter escrito que a elite brasileira não admite que os votos dos pobres tenham o mesmo peso que os dela); é mais do que isso: o fascismo usa uma estratégia de afetos de medo e ódio, disseminando-os de forma que cada uma das pessoas se torna não apenas vítima, mas agentes mesmo deste afetos: é uma mobilização política que passa por dentro dos corpos, dos desejos, do sistema nervoso das pessoas, e ganha essa dimensão macro porque é antes micropolítica.  Fascismo não é apenas proibir as pessoas de dizer ou fazer algo, fascismo é forçá-las a falar e fazer algo.

Cada uma das grandes corporações de comunicação do país, onde predominam 4 ou 5 famílias oligárquicas ( os Marinhos, os Frias, Os Mesquita, os Civita…) foi fundamental na mobilização entre as classe médias e as elites que levou ao golpe militar de 64, com uma estratégia muito semelhante a usada hoje pela campanha Serra.  A exceção é a não menos proto fascista revista Veja, simplesmente porque não existia na época. Estes grupos cresceram e se solidificaram no Regime Militar, enquanto os que se opunham ao Regime desapareceram ( por exemplo o “Ultima Hora”, e também o “ Correio da Manhã” que chegou a apoiar o golpe mas começou a fazer oposição aos militares logo depois). Ainda nesta tática de confusão da propaganda, estas corporações de comunicação apresentam-se como grandes vítimas da ditadura.

De fato, a partir do final de 68, no AI-5, instalaram-se nas redações censores oficiais do regime. Mas antes, nos primeiros quatro anos que se seguiram ao golpe que ajudaram a promover (entre 64 e 68), cada um desses “veículos de comunicação” apoiava e promovia a onda de prisões e cassações que acontecia entre líderes políticos, sindicais, professores (expulsos das universidades) e assim por diante . As organizações Globo, como sabemos, foi mais longe de todas: de 1966 até o início dos anos 80 lia um editorial todo dia 31 de março no Jornal Nacional relembrando e apoiando a “ os ideais da revolução de 64” .

É esta gente e esta estratégia que quer derrotar a qualquer preço a candidata Dilma Roussef.
E aqui talvez para não abusar do leitor, eu deveria encerrar meu texto. Mas não consigo não acrescentar mais um parágrafo para falar do quanto o golpe de 64 teve a ver com o ódio e o medo que causava nas elites a participação de trabalhadores na política que na época crescia a cada ano (o discurso da “ameaça da república sindical” repetido por Serra agora), de como o Brasil começava a se democratizar e os sindicatos conseguiam alguns ganhos para os trabalhadores, do fato do problema de origem escravocrata da concentração da terra ( e das relações de trabalho) ter sido colocado em questão pelas ligas camponesas e como Jango foi acusado de “comunista” por ensaiar um tímida reformas agrária, e de como Paulo Freire (um dos primeiros intelectuais presos depois do golpe) sofreu a mesma acusação por liderar um programa que alfabetizou 400 mil pessoas em Pernambuco, e assim por diante. E o mais notável: como que nos anos de grande crescimento econômico do regime militar a miséria do país só aumentou? Como o Brasil terminou este período como a nação industrializada mais desigual do mundo?

Não dá para separar a violência política do regime militar da violência do modelo econômico. Assim como não dá para separar a violência contra a candidatura Dilma da violência contra os pobres; e também da violência contra as mulheres; a propósito foi no governo Lula que foi criada e aprovada a lei Maria de Penha.

Não há neutralidade possível nas eleições do dia 31 de outubro para quem busca um Brasil mais justo, solidário e democrático.

FONTE: VIOMUNDO Jornalista Luis Carlos Azenha

Nenhum comentário:

Postar um comentário